
Anna Carolina
Allen x Mahomes: a próxima grande rivalidade de quarterbacks
Os fãs da NFL adoram uma rivalidade, em especial entre quarterbacks. Seja para disputar a vaga de titular, seja por conta da geração em que se encontram, a tendência é que sempre terá, pelo menos, uma pequena rivalidade. Joe Montana vs. Steve Young, a rivalidade da classe de 1983 (Elway, Kelly e Marino), Brett Favre e Drew Bledsoe, a lista é interminável.
Ao longo deste século XXI, fomos presenteados com uma entre dois dos maiores QBs da história do esporte: Tom Brady vs. Peyton Manning. Entre 2001 e 2015, os dois se enfrentaram 17 vezes, incluindo quatro finais de conferência. Apesar de Brady ter mais números de vitórias no geral (e mais anéis de Super Bowl), é Manning quem tem mais vitórias na final da AFC: três, contra uma de Brady. Com a aposentadoria do eterno camisa 18 e depois a ida de TB12 para Tampa Bay, a Conferência Americana ficou órfã de uma boa rivalidade de QBs. No entanto, esse cenário começou a mudar na última final da AFC, e tem tudo para se tornar ainda maior este ano.

Patrick Mahomes e Josh Allen foram os protagonistas da final da AFC de 2020. Em pleno Arrowhead, o Kansas City Chiefs confirmou seu favoritismo e foi ao Super Bowl. Mas a semente da rivalidade foi plantada ali. O Buffalo Bills se tornou o principal desafiante a atrapalhar a possível dinastia dos Chiefs, e mais do que isso: Josh Allen se tornou um candidato a roubar títulos de MVP.
Em 2020, ambos os QBs combinaram para 9284 jardas e tiveram 75 passes para touchdowns antes da final de conferência. Na sua quarta temporada na NFL, Patrick Mahomes liderou a liga em jardas passadas por jogo (média de 316.0) e foi o quarto em touchdowns passados, com 38. Ele liderou Kansas City a uma campanha 14-2 e a sua terceira final de conferência seguida e em casa, um recorde até então nunca batido na história da AFC. Detalhe: ele só tem 25 anos.
Se Mahomes está fazendo história de um lado, Josh Allen começa a escrever uma trajetória tão absurda quanto. Até a temporada passada, o QB dos Bills ainda era uma incógnita. Seus dois primeiros anos na liga foram uma montanha-russa, repleta de altos e baixos. O talento estava ali, entretanto muitos analistas e torcedores – esta que vos escreve junto – não acreditavam que ele evoluiria além do que mostrava. Ledo engano. Josh Allen calou a todos e foi candidato ao prêmio de MVP. Claro que a chegada de Stefon Diggs contribuiu e muito para a sua evolução, mas as estatísticas individuais do QB já demonstram isso por si só. Allen saiu de 58,8% de passes completos para impressionantes 69,2%, além de ser o 4° da liga nessa estatística, atrás apenas de Matt Ryan, Tom Brady e Bem Roethlisberger. O número de passes para touchdown foram 37, um a menos do que Mahomes, levando seu passer rating para 107.2 – um número formidável.

A evolução praticamente faraônica de Josh Allen levou o Buffalo Bills a uma campanha 13-3, ao seu primeiro título de divisão neste século e sua primeira final de conferência desde os anos 1990. Seja com a chegada de Diggs, a mecânica de passe melhorada, a sua evolução natural como jogador ou todos esses fatores combinados, é certo dizer que Josh Allen passou de um quarterback talentoso, mas cru e cheio de erros, em suas duas primeiras temporadas para um forte candidato para MVP em 2020. Se existisse o prêmio de Most Improved Player na NFL, provavelmente Allen o ganharia. A melhora foi impressionante, e não há nada que indique que isto será um caso isolado.
Na offseason do ano passado, em entrevista ao SportsCenter da ESPN americana, Mahomes disse que não tinha nada a ceder para Allen, nem mesmo o título de braço mais forte da liga. “Óbvio, Josh tem um braço muito forte”, disse o QB na entrevista. “Mas eu ainda estou para ver alguém com um braço mais forte do que o meu, então talvez nós possamos comparar e dizer quem realmente tem o braço mais forte. Eu tenho fé de que sou eu. Ele [Allen] tem mesmo um braço forte, mas eu já lancei para 80, 85 jardas. Se ele bater isso, ele vencerá”.

Não há muitos paralelos que se pode traçar entre Allen vs. Mahomes com Brady vs. Manning, a rivalidade que citamos acima. Para começar, os mais novos possuem muito mais atleticismo do que Brady e Manning jamais pensaram em ter. Hoje em dia, os quarterbacks são muito mais móveis e conseguir jardas correndo com a bola (Lamar Jackson que o diga) do que antigamente. Logo, é até prematuro compará-los com dois QBs que juntos tem 13 aparições em Super Bowls e nove campeonatos. Mas a rivalidade Brady vs. Manning definiu a AFC por 15 anos, sem dar espaço para novos desafiantes. Algo que com Allen e Mahomes é diferente.
Antes mesmo de Josh Allen ter sua evolução digna de um Pokémon, o próprio Lamar Jackson, citado aqui acima, já estava nessa batalha e foi o MVP de 2019. Ele é mais novo do que Mahomes e Allen, além de ser imensamente talentoso. Porém, o QB do Baltimore Ravens não passou (ainda) do division round: a última perdendo, inclusive, para o Buffalo Bills. 2020 não foi o melhor ano dele, pessoalmente falando: Jackson teve 26 touchdowns, 9 interceptações e foi sacado 29 vezes. Para se ter uma ideia: quando pressionado, Lamar teve 5 touchdowns e 4 interceptações (menos de 50% de passes completos), enquanto que, com o pocket limpo, ele teve 21 touchdowns e 7 interceptações – 70% dos passes completos. Baltimore vem fortíssimo para a próxima temporada, porém Lamar está sob pressão. O jogo terrestre deve ainda ser o seu forte, mas o ano passado mostrou que ele precisa encontrar consistência no passe e evoluir mentalmente.

Outro que pode se encaixar nessa briga é outro da AFC Norte: Baker Mayfield. O Cleveland Browns surpreendeu na temporada passada, chegando aos playoffs pela primeira vez desde 1993. O time vem forte na briga dos playoffs, mas está contando com a evolução de seu QB para voar ainda mais alto. Mayfield teve 62,8% de passes completos, 26 touchdowns e oito interceptações, este último o menor na sua carreira. A chegada de Kevin Stefanski e o uso melhor do play action deixaram o jovem QB bem mais confortável. Ele também tem 25 anos, assim como Allen e Mahomes, e conseguiu superar o seu 2019 horroroso. No entanto, alguns torcedores mais céticos desconfiam ainda se o QB ainda pode evoluir mais. Se Mayfield mantiver números parecidos com os da temporada passada, a expectativa é que ele melhore sim.
Neste exato momento, Patrick Mahomes e Josh Allen estão um patamar acima, bem como seus times. Ambos possuem o combo de talento mais armas ao entorno do que os outros QBs da conferência. A última final da AFC provou coisas para os dois. Para Allen e os Bills, é preciso mais esforço (e menos blitz) para parar Mahomes e seus amigos. Para Mahomes e os Chiefs, que construir uma dinastia não será tão fácil assim – não enquanto tiver Tom Brady jogando. A única certeza que se pode cravar é a garantia de que teremos grandes duelos nos próximos anos.